sexta-feira, dezembro 09, 2005

Suicídio

A lâmina fina
brilha com os olhos
encharcados...
indecisos...
A mão treme
na espera da decisão.
Encosto seu gume
nas veias assustadas
do pulso gelado.
O medo e a solidão crescem.
A primeira pressão
dói e faz o vinco.
Agora está cravado o destino.
Respiro fundo,
o tremor aumenta.
Preparada!
A força, impulsionada
pelo medo e pelo cansaço,
cai sobre a lâmina
e o vinco se torna
um camino aberto
para a morte e o fim.
A dor sobe com o sangue
e percorre o braço, a mão,
o chão...
E no chão,
a lâmina banhada em sangue
infectada de arrependimento.
Lágrimas diluem o vermelho turvo
para tentar consertar
a covardia que se espremia.
O grito de dor explode
com o peso de não ser capaz
de dar um fim
na agonia que pulsa nas veias.

sábado, dezembro 03, 2005

Alma das palavras

Incrível como as palavras saem tão verdadeiras da boca, que achamos serem eternas. Na verdade são, quando escritas, no papel, na net, em qualquer lugar. E então, passa o tempo, mudam as coisas, muda a vida, mudam os sentimentos... e, aí, eu me pergunto: a alma das palavras escritas também são eternas? Ela também permanece quando escrita?

Bom, o mais confortante é pensar que só são eternas se eu acreditar. Se encontrar palavras que doem e que sei que foram verdadeiras quando escritas, penso que sua alma não está mais lá... restaram apenas esses vestígios travestidos de letras. Se encontrar palavras que enchem o peito de calor intenso, penso que, essas sim, são eternas. Que terão sua alma viva por todo o tempo que eu existir.

Alienação? Comodismo? Covardia? Proteção? Cegueira?
Chamem do que quiserem... as palavras que leio são minhas, faço com elas o que eu precisar.

domingo, novembro 27, 2005

"Não sei"

"Não sei": palavras idiotas!
Não consigo enterrá-las...

quinta-feira, novembro 24, 2005

Insônia

4h27 am
Não Otto, não é hora de levantar ainda. Faltam algumas longas horas...
É que meus olhos não querem mais dormir, não conseguem não ouvir minha mente. Turbilhão de imagens, sons, cheiros... meu corpo não consegue acompanhar, nem se desligar. Fico, então, neste estado de insustentável parasitismo... a tempestade mental vai arrastando o corpo cansado que rasteja pelo ar. E ficam, mente e corpo, num mutismo ensurdecedor sobre a cama, que a cada minuto vai se transformando em espinhos.

4h56 am
Pensamentos hematófagos me tiram a energia que começa a brotar com o sono e logo o transformam em uma sonolência ritmada. Quem dera fossem pensamentos lógicos, que se aproveitem. Mas não, ficam numa constante divagação quebradiça.
Por alguns instantes você consegue me frear. Interrompe o silêncio agudo com o seu “brincar com a bolinha”. Pra mim, o chocolate serviu para distrair a fome, pra você, para distrair minha insônia. Sigo suas patinhas peludas, meias brancas, exatamente dois pares. Tocam com delicadeza e agilidade a bolinha de papel. Cambalhotas, pulos inesperados, rebolados ataques, contorsionismo incrível e leve, no meio da penumbra.
É Otto, você sabe como driblar as horas de não-sono. Eu? Caio novamente na loucura amarela de palavras soltas. O engraçado é que sua constância aos pouco se transforma numa massa rítmica, densa, pesada, que força minhas pálpebras para baixo... o turbilhão atinge um grau rítmico hipinotizante... o silêncio agudo volta a envolver meu corpo...

5h28 am
Sono...

domingo, novembro 20, 2005

Ah... domingo...

Por que a tarde de domingo provoca essa imensa vontade de escrever, seguida de uma grande falta de assunto?
A falta de assunto... deve fazer parte do domingo. Ainda mais numa tarde quente, silenciosa, em que se ouve apenas o barulho do mastigar do cachorro com a ração. De vez em quando, talheres batendo na pia (estão lavando a louça do almoço), pelo menos algo que quebra um pouco este mormaço branco, mesmo que com água gelada engordurada.
É... a falta de assunto é um assunto... mas que não dura muito... acaba logo.

sexta-feira, novembro 18, 2005

A estátua

Seus olhos inexistem,
sua respiração está congelada,
o calor do seu corpo depende do sol,
suas lágrimas, da chuva,
seu cheiro, a urina forte do homem.
Mas sua dor é completamente sua
e, agora, também minha.
Seu grito se movimenta
nas suas veias de pedra.
Sua tensão faz rachar
com força o que a sustenta.
Dia e noite
você explode o silêncio do meu olhar
por tão forte ser seu movimento
e me faz perceber
quão capazes somos nós
de aprisionar nossos gritos.
“Todo dia ela faz tudo sempre igual…”, pois é Chico (Buarque), todo dia, correndo, atrasada, com duas Bonos de morango na mão esquerda e o Nietzsche na direita (com qual mão dar bom dia ao porteiro? Use a cabeça, literalmente!).

“Correr” dois quarteirões já é o suficiente para engolir as bolachas. Paro no sinaleiro (sim, não é farol, farol é de carro), agora tem que ficar esperando fechar para poder correr atrás do ônibus – esse corredor... É tão relaxante ver passarem seus ônibus e você não poder “dar sinal” para parar porque está do outro lado da rua e o sinaleiro nunca fecha... Depois de passar todos os que me servem, o homenzinho verde acende e os mocinhos com a bandeira de PARE ficam lá, “parando” os carros – como se ISSO é que fizesse eles pararem. Gostaria de um dia ver eles tentarem colocar a bandeirinha antes do sinal fechar... seria lindo...

Depois de horas esperando, chega o meu “busão” e penso: vou me sentar, ler meu livro... ha ha ha... sentar? Onde? Ficar em pé sim, bem atrás daquele rapaz com uma mochila gigante nas costas que fica te empurrando contra o outro banco cada vez que o ônibus faz uma curva. Então, o “busão” passa pelo ponto e não abre a porta, aí vem a sinfonia: “VAI DESCÊ MOTORISTA!”...
Uma etapa cumprida (e comprida): finalmente o metrô. Agora sim, menos empurra-empurra, menos malabarismos (já chega os das esquinas). Estação inicial é uma marvilha, finalmente posso me sentar e ler meu Nietzsche – “como filosofar com o martelo” – um subtítulo que veio a calhar (que vontade de quebrar tudo com um martelo). Mas o mais interessante ainda é como o livro começa: “Conservar a sua serenidade frente a algo sombrio, que requer responsabilidade além de toda a medida, não é algo que exige pouca habilidade.” – não mesmo, requer muuuuuuuuita habilidade.

“Piiiiiiii!!! Sta... ção... Kkk… on… sssção…”, pobres coitados os que dependem desta voz para saber em qual estação o trem vai parar. Todos descem na Consolação, isso é bom, não preciso desbravar o mar de corpos pra sair antes que a porta feche no braço ou no pé que ficou pra trás. Mesmo assim, achou que estaria livre, mocinha? NÃO! TODOS MESMO descem nessa estação e só tem duas escadas rolantes pra TODO MUNDO, e uma não rolante que, se você subir correndo, VOCÊ passa a ser uma rolante. Tudo bem, pra não ser atropelada, a gente espera (ai... cadê esse martelo...).

Ufa... saí do “bafo subterrâneo”. A calçada da Paulista é como a marginal em horário de pico. Às vezes, a gente tem que pular pra frente pra ver se consegue ultrapassar o fluxo humano que vem e pegar carona no que vai (uma das técnicas quando não se tem o tal martelo). Quando o fluxo desacelera já é possível olhar para cima, ver os prédios iluminados pelo sol e pelo som dos carros e as eternas buzinadas, dá até pra ver o homem limpando o prédio espelhado, misturando-se com o azul do céu e dos vidros.
Caminhando em meio ao som da São Paulo agitada, um barulho atípico me captura no meio ao caos. Sim, uma bela combinação de de um acordeão, um triângulo e um tamborim. Dois senhores e um rapaz, em plena 9h na Av. Paulista. Todo o som agitado foi anulado por aquela melodia que mais parecia brincar na calçada, tentando encher o chapéu de moedas.
Fiquei emocionada... mesmo. Meus dentes travados se soltaram e até ameaçaram um sorriso.
Já quase andando de costas (sem trombar em ninguém... incrível...), fui sentindo a melodia sumir, devagarinho, a se misturar às buzinas novamente. Depois, tudo voltou ao normal (normal?). Bom, ao menos, não foi tão “tudo sempre igual” assim...
Acordei! Malditos pesadelos! Acordar no meio da madrugada e olhar as horas, ação automática e pouco feliz. 3:37 AM (Ai, Merda). É só olhar no relógio e pronto, o sono vai embora. Acendo a luminária, a luz avermelhada desperta as silhuetas noturnas. O gato, deitado no meu peito, olhos grandes e brilhosos em minha direção. Bigodes longos e metidos ajudam a me indagar: você também perdeu o sono? Tenta me devolvê-lo com um ronronar hipnotizante, mas, em vão.

A sensação ruim deixada pelos sonhos preenche o vazio da noite. Meus pensamentos fogem em direção aos seus olhos, ao seu sorriso, que ficaram cravados em mim, como tatuagens. Preciso do seu abraço, da sua voz. Mas é tão tarde...

Olho pro lado e lá está, tingido de vermelho pela luz, o seu pedaço de guardanapo. Vejo sua letrinha azul, a primeira, U, refoçada três vezes, até quase formar um vinco no papel, na tentativa de fazer a tinta descer pela ponta da caneta. “Um sol no meio do céu noturno”. Ao ler, ouço sua voz na minha mente. Sinto seu calor, suas mãos, ao escrever neste pedaço de guardanapo roubado de um bar. Finjo acreditar que você escreveu pra mim, justamente para este momento “Um sol no meio do céu noturno”. Você me trouxe o sol pra me confortar nesta madrugada insone. Não tenho seu corpo para apertar contra o meu, nem sua boca pra me dizer “te amo”, quase que em silêncio, apenas com o toque dos seus lábios nos meus, envoltos com o calor de seu hálito. Mas, mesmo assim, você está em mim, na minha pele, no meu coração, iluminando meu céu noturno com seu olhar, o sol, preenchendo todas as minhas horas.

E, então, minha alma se aquece, aquieta-se... e o sono vem, tranqüilo...
Minh’alma está rasgada...
Um longo sulco dolorido...
que se abre cada vez mais
com o peso e a acidez de inquietações.
As palavras tentam falar,
em vão...
Escorrem pelo vinco profundo,

levando a memória desfeita em sangue.
O pior barulho de se ouvir é o de uma mosca!
Como um barulho desses pode trazer todo um cenário? Real? – Calor insuportável, sol de derreter os movimentos, paralisia total... física e mental... – Nada é mais vazio do que ouvir uma mosca... nada é mais solitário... tedioso... banzo total!!!
O zumbido descontínuo... zzzzzzz... zz... z... (-)... zzzzzzzzz... (-)... zzz... reafirma meu estado estacionário... latente, talvez. Sensação de fracasso... até a mosca tem a dizer!
Enquanto há o “zzz” minha consciência vive. Quando se “ouve” as lacunas, ela se desespera, porque tem que pensar em algo, imediatamente. E o “algo” surge em forma de inconformidade. Pra onde vão meus pensamentos? Por que eles me deixam quando preciso? Por que se viram contra mim e me questionam? – Mas então eles voltam? – E onde estão?
Mesmo que me apontem o dedo, apareçam! Não me abandonem!
Mesmo que sirvam para me inquietar ou me enterrar neste estado latente – de lá tente me tirar – ahhhhh... TROCADILHOS NÃO... VOLTEM PENSAMENTOS CONSISTENTES, TIREM-ME DESSE LACONISMO CEREBRAL!
Nossa! Estou gritando!
Pra onde foi a mosca???

A morte da vela

Pavio preto e e cansado, ainda tomado pelo fogo. Mergulhado em seu próprio corpo.

O fogo toca o mar quente com seus pés azuis. Seus braços amarelos aos poucos perdem força. A chama vai se agachando, a alma, encolhendo até sufocar e se afogar em seu próprio sangue.

As dezoito horas da Catedral da Sé

Dezoito horas. Sua tez amarela-se com postes e luminárias, seu canto soa alto em doce e forte melodia por todos os seus poros e vitrais. O vento monstruoso e geladodesliza pelo seu corpo frio, imponente, espalhando as seis badaladas intercaladas por toques de contra-tempo como um albatroz que tropeça no ar. Vejo-a de longe, mas de tão perto... Aos seus pés o movimento vai cessando e você vai se calando. Mas ainda assim, seu silêncio pesado faz ecoar na memória a melodia de descanso.

Personagens

Vive das histórias de personagens de histórias que têm por aí e de personagens que ela mesma inventa. Assim, pode viver as emoções que lhe convierem. Pode realizar sonhos sempre, exatamente como idealiza. Mas as histórias duram pouco, às vezes nem terminam. Alguns personagens são esquecidos, outros se repetem constantemente.
Passa pelos caminhos cega da realidade, sem perceber nada que está ao redor. Segue em seu destino real/concreto embalada pela imaginação sem se dar conta de onde está e para onde vai. Mas sempre chega ao destino por condicionamento e nada mais, porque todos os seus pensamentos estão ocupados em criar histórias e personagens.

O grande salto

Sob os olhos, somente o vazio cercado por janelas em arquibancadas, indiferentes à minha decisão. Fracas, petulantes, enquanto eu caminhava de um lado para o outro elas disputavam decisões e caminhos a serem seguidos. Agora que estou aqui, pronta para desistir de tudo, elas ficam assim, imóveis, olhando-me pateticamente.

As luzes lá em baixo são apenas pontinhos luminosos, tão pequenos que não consigo ver o asfalto como o fim. Tudo se mistura. O vento sobe forte desse vazio negro, gelado. Bate em meu rosto me chamando para seu cerne silencioso. Nesse instante parecemos ter o mesmo cerne, e mais nada dentro de mim, a não ser minha decisão.
Sim, desta vez nada vai me impedir, nem mesmo o suor das minhas mãos ou as lágrimas duras que se deitam sobre mim. Já chega! O fim me chama há muito, agora é a hora... eu sinto. A respiração acelera, o estômago se contorce louco para saltar, o sangue ferve e tensiona todo o meu corpo, empurrando minha alma pela garganta, as lágrimas fogem por todos os lados e me salgam por inteira. São as primeiras a saltar, sumindo na escuridão. O vento volta a me puxar e me desfaço em seus braços.

Meu corpo pesa em direção ao fim, aos pontinhos luminosos, ao vazio do meu cerne. Estou voando para o fundo. Ao meu redor vejo “flashes” de cenas, uma em cada buraco na parede do vazio que vou percorrendo. O sol brilha trazendo pontas de dedos e gargalhadas de desconhecidos. Traz pedaços dos meus fracassos em vidros de papelão molhado que vão se desfazendo entre os raios de sol que me ofuscam o olhar, que me sufocam e me comprimem na minha escuridão. As gargalhadas não param, ficam cada vez mais fortes, unem-se num único grito assustador que me faz abrir os olhos secos, com braços de lágrimas melados. Só então percebo que é meu corpo gritando o desespero e o arrependimento. Passo por um grande ponto luminoso na escuridão e já posso ver o f...

Madrugada Paratiana

Por poucos momentos intacta,
desprotegida e nua
sob a chuva da madrugada,
amarelada e úmida.
Por gritos mudos
aprisionados em poças,
espelhos de sua expressão,
por sua tez colorida,
com fendas esculpidas
pelo tempo artista
vagam olhos admirados.
Em murmúrio constante,
de macio cair em pedras,
espera o calor que se levanta
e aos poucos apaga e enxuga
o amarelo combinado
para dourar em instantes
seu despertar para um novo dia.

Isolamento

No cerne da solidão, ouço um silêncio surdo, um movimento moroso e dolorido, que vai corroendo com paciênicia todos os meus sentimentos.

Quero sair de mim, abandonar meus sentidos, no seu isolamento total, devorá-los sem deixar uma migalha sequer para que eu não sinta dissolverem-se na angústia e cumprirem seu destino de se entregar à solidão.

Tempestade

Brada forte
céu bravo!
Grita por mim!
Porque minhas súplicas
não são ouvidas,
são surdas de tão intensas.
Chora toda a tua água
mesmo que termine
no mais sujoe profundo esgoto!
Porque minhas lágrimas
já foram enterradas
enquanto caminhavam
pelo silêncio.